quinta-feira, 20 de junho de 2019

TESTEMUNHO RETIRO 10 DIAS DE SILÊNCIO
Escrever tem sido relativamente fácil e natural quando me permito que a alma o faça. Mas não nestes últimos momentos. Escrever tem-me sido difícil. Não me apetece falar ou fazer o que quer que seja. Tudo isso é exterior a mim, para além de mim. O expressar por palavras neste retiro foi quase impossível. As palavras não faziam sentido, não fluiam. No entanto o contribuir com o meu testemunho é apenas porque vos amo. Assim sendo, decerto que darei o meu melhor.
Este retiro foi mais um confirmar o que Sou. Um afirmar de um compromisso comigo mesma. Já não há volta nesse caminho ao encontro de mim mesma. Na verdade se existe um querer é esse. Só esse faz sentido, só esse é prazeioso, só isso preenche, porque tudo isso sou eu a abraçar-me.
Abraço-me em silêncio. Abraço-me e observo como toco as coisas com as pontas dos dedos. Observo como a respiração é doce e meiga. Observo como o meu corpo é vida, num misto de calor no peito e este formigar que o percorre, onde o coração quase não bate. Observo a naturalidade como o meu corpo se expressa em lágrimas de gratidão. Tudo isto observo daqui deste nada, deste silêncio...onde o dizer que amo ou agradecer deixam de fazer sentido...onde apenas sou existência.
Poderei partilhar alguns momentos vivenciados no monte da fonte. Sim, poderei partilhar mas jamais por estas simples palavras ouvirão a melodia por detrás delas. As caminhadas pela natureza onde observas o que és...onde observas a naturalidade desta dança da vida. Onde permites amar e ser amada. Onde és presentada com borboletas azuis, lilases, amarelas, os pássaros e o seu chilrear...onde encontras uma pena branca pelo caminho. Onde as pedras têm cor....onde a água corre livremente sob um manto de flores...onde a beleza e harmonia em tudo o que te rodeia te silencia cada vez mais, até que o abraço da brisa te une a tudo isso e apenas és...dançando....
Quando me apoio nos ramos das árvores em auxílio da travessia do riacho, apoio-me nos meus braços...quando me equilibro nas pedras, apoio-me no meus próprios pés...quando desvio a folhagem para seguir em frente, afasto os meus cabelos dos olhos....do mesmo modo que me apoio nos braços de quem me acompanha nesta travessia...naturalmente...
Sim, também observei o desequilíbrio e o escorregar...mas o que é isso perante tudo?
Sim, poderei partilhar o sentir do prazer da entrega de mim mesma e o receber da existência numa sessão de Ceushi, muito para além do observar de como estou equilibrada em cada exercício. Sim poderei escrever prazer, mas como transmitir esse prazer? 
Poderei partilhar que vi o céu na terra e o prazer foi orgásmico...num simples exercício onde estou de joelhos e me reclino para trás, sempre numa entrega total....apenas abri os olhos e vi...que é real o céu na terra. Queria permanecer ali sem me mover...não queria continuar a fazer outros exercícios....mas continuei....é apenas mais um milagre que se junta à coleção que me completa. 
Tanto que havia por dizer… ou não….momentos como por exemplo numa meditação em que senti que cantava com crianças…na altura pensei que fossem os sobrinhos do Joaquim que se tinham juntado a nós… mas não… a minha criança interior resolveu cantar com as outras presentes…
Poderei partilhar o que é sentir a energia do sol nas células do corpo...poderei partilhar o que é não sentir fome, porque me senti saciada...poderei partilhar o que é existir com tudo e com todos? Sim...mas não por palavras...
No entanto partilho uma das experiências do que é ultrapassar a ideia de limites, numa caminhada. Quando sinto que já não é possível caminhar mais, observas isso e apenas o que existe é a respiração. Observas a respiração e observas como o teu corpo apenas se move. Como as tuas pernas parecem ter vontade própria e seguem em frente como que hipnotizadas. Como se não fizessem parte de mim. Movem-se porque receberam uma instrução e gravaram isso, para além da ideia de cansaço ou seja lá o que for.
Partilho também o momento auge… se é que isso existe, todos o são… enfim…
Para quem “entender” o que é morrer e isso ser o prazer. Para quem “entender” que o morrer/render é o renascimento. Para quem entender o que é o prazer de ser nada... Para esses e para quem quiser, o exercício que fizémos na simulação da nossa morte e que o faria mil vezes mil, na consciência de que morro a cada momento, é sem palavras....apenas existi nada mais...apenas a presença deste corpo, o bater do coração e a vida que o percorre.
Gostaria sim de partilhar o ultrapassar de mim mesma, nesse exercício… Na consciência do que significa a morte e o desejar para quem quer que seja, onde o apoio se manifesta na voz da alma, então essa forma de traduzir o meu amor expressou-se numa voz de alma diferente…espontânea, profunda e até surpreendente. Para alguém que interioriza, exteriorizar é muito libertador. Observo também que a Sandaya por amor se ultrapassa. Bom observar isso.
Na verdade, quando foi a vez do Joaquim morrer, foi de tal modo que, já ele tinha ressuscitado ainda eu estava de olhos fechados a cantar e a dançar 
E como desejei a sua morte….
Somos lindos……
Nada mais quero…
Sou nada, existo no fluir da existência na consciência de que tudo sou eu...num perpétuo abraço...
E sim, é possível morrer definitivamente no monte da fonte...
A todas as estrelas que partilharam estes dias na minha companhia, a minha profunda gratidão. Aos que entraram e saíram desta dança. Grata pelos sorrisos, pelas gargalhadas, pela simplicidade, naturalidade, espontaneidade pelas lágrimas, pelas resistências, pelos olhares, pelos abraços, pelo amor, por me terem dado de comer e de beber. Grata pela partilha do que são naturalmente. Tudo isso sou eu.

A ti, personagem Joaquim, que tanto amo, eterna gratidão. Grata pela possibilidade de ter partilhado estes dias na tua presença, em família... onde apenas se é sintonia...
Sandaya Lys

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